Coluna História & Estórias – Por Chico Lelis


Não sei como é hoje, com tantas marcas e tantas diretorias, que convivem dentro da Stellantis (você já contou quantas são? Pois digo: Abarth, Ferrai, Alfa Romeo, Chrysler, Citroën, Dodge, Fiat, Jeep, Peugeot, RAM, com um número enorme de modelos e suas opções), mas nos tempos em que era só Fiat, a coisa corria rápida como rastilho de pólvora.

Certa vez eu disse a um ex-diretor da fabricante que eu achava que as coisas lá dentro aconteciam assim: três ou quatro diretores se encontravam no corredor e um deles lançava uma ideia. Todos iam para suas salas e, como que por milagre, o projeto estava pronto para seguir adiante.

A resposta dele foi: “sua colocação é um tanto quanto fantasiosa, mas aqui nós não perdemos muito tempo com reuniões intermináveis como acontece em muitas empresas, quer sejam do setor ou não”. E ele falava de cátedra, porque já havia trabalhado em outras duas fabricantes de veículos.

Pois bem, um dia fui o estopim para provar essa rapidez que reinava na Fiat. Corria o ano de 2010, e a marca levou dezenas de jornalistas até Betim, para conhecer o novo motor E.TorQ,  1.6 16V e 1.8 16V, nos modelos da linha Palio. Na verdade, eles já equipavam o Punto e em breve iriam também para o Idea.

Antes da apresentação formal do carro, visitamos a linha de montagem, como sempre acontecia nos eventos das fábricas de automóveis.

Fomos levados para um auditório onde engenheiros, designers e pessoal de vendas falaram do produto, inclusive do novo tecido que adornava os bancos do modelo.

E onde está escrito E.TorQ? 

Foi então que eu criei a maior “saia justa” para a diretoria da Fiat brasileira com a minha inocente pergunta, antecipada por um pequeno “discurso”: todos sabemos que entre nós, brasileiros, não basta comprarmos um carro novo. Ele precisa parecer novo, ter algo que o diferencie do carro anterior. Afinal, se o consumidor tem um Palio na garagem e compra um outro Palio, mas este com E.TorQ, mas não tem nada que prove isso, seu vizinho não vai acreditar que seja um modelo novo.

É que, durante a visita à fábrica, eu não vi nenhum carro com a inscrição (logo) referente a nova motorização.

A própria Fiat, anos antes colocou um adesivo nos vidros traseiros do seu Uno (modelo antigo) que ele era fabricado naquele ano, pois não havia nenhuma atração para conquistar o consumidor.

Foi ai que o diretor da Engenharia da Fiat e responsável pelo E.TorQ, abriu um enorme sorriso e me agradeceu, “reclamando” que tinham esquecido deste detalhe. E me convidou para tomar um café.

Os diretores trocaram olhares entre sim, como que dizendo, “que mancada Fred” (lembra quando o Barney falava isso ao Fred, nos Flinstones?). Bem, depois desses olhares, o diretor Comercial explicou o inexplicável e a coletiva seguiu adiante.

Por que estou fazendo essa introdução?  Para endossar minha tese inicial de que na Fiat, muitas “reuniões” nos corredores viravam decisões importantes em poucas horas.

Acontece que, dois dias depois, exatos dois dias, todos os novos modelos, incluindo os que já estavam nas concessionárias, a milhares de quilômetros da Betim, exibiam o adesivo E.TorQ na sua traseira.

Recentemente perguntei a alguém da Imprensa Stellantis se ainda era assim e a resposta foi assim: “por incrível que pareça, as decisões são tomadas com uma grande rapidez na empresa”.

E, dias depois daquele lançamento, o carteiro bate à minha porta com uma caixa nas mãos, com o nome do diretor da Fiat estampado no “remetente”. Quando abri, lá estava uma dessas modernas máquinas de café e um bilhete dele.