Coluna “De carro por aí” – Por Roberto Nasser

 Caricatura Roberto Nasser

Coluna 0117     04.Janeiro.2016                      

 

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República Dominicana

 

De Carro na República Dominicana

República Dominicana fica no Caribe, meio caminho entre Américas do Sul e Norte. Pouco lembrada, foi o ponto de inflexão do desenvolvimento mundial quando, em 1492, Cristóvão Colombo aportou, logo instalando o primeiro Vice Reinado extra europeu. Diego, seu filho, foi pioneiro Vice Rei a operar no Continente Americano e seu palácio, o Alcazar de Colón, construído em 1512 até hoje remanesce como atração no Centro Histórico, contando história com auxílio de mobiliário e utilidades de época, auxiliado, em seu entorno pelos primeiros prédios erigidos nas América: administração, igreja, forte, alguns ininterrupta e secularmente ocupados pela gestão do poder. Como lembrança, o Brasil foi descoberto oficialmente em 1500, mas os portugueses registraram e largaram. Os franceses pilharam o país até 1565 quando expulsos por Estácio de Sá, representando a Coroa. Na prática o Brasil começou em 1565 no Rio de Janeiro, nas proximidades de onde hoje está o abandonado Hotel Glória.

Superfície do país é de 48.500 km2, soma aproximada de Alagoas e Sergipe, e divide com o Haiti a Ilha Hispaniola, segunda maior – primeira é Cuba. O dividir é ao pé da letra. Haiti, primeiro país a tornar-se independente nas Américas, é o mais pobre do Continente; população predominantemente negra; assinalado por desastres naturais inexplicavelmente limitados às fronteiras. Sua população tem melhor situação de educação, conhecimento e interpretação, e menor acidentalidade com veículos. Os dominicanos são arrepiados com os vizinhos.

Pouca industrialização, economia de base com criação de gado, plantio de cana, arroz, produção de sal, os dominicanos demoraram a demarrar-se em integração pelo deficiente sistema de ligação e transportes, tomando muitos anos evoluir dos cascos dos animais, ferrovias, às estradas de rodagem. E destas apenas as novas, de instigação turística, tem boa qualidade.

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RD, mapa geral

 

Sua economia foi traçada como dependente dos gastos dos muitos turistas. Dados de 2015, país teria imaginados 11 milhões de habitantes, e recebera quantidade quase igual de visitantes, e facilita, sem necessidade de Visto e por pagamento de US$ 10 por pessoa à chegada no Aeroporto. Na ocasião você entende a lógica da operação: há duas pessoas para processar o tíquete de entrada: uma entrega, outra recebe …

Nas localidades dedicadas ao turismo estão, ao Norte, Punta Cana, com enorme quantidade de hotéis no sistema all inclusive – fácil entender: é um enclave americanizado, sem cidade dominicana nas proximidades e, assim, os hotéis devem criar a própria ilha de serviços para atender aos hóspedes. Estes, em sua maioria, norte-americanos de renda média e baixa, brasileiros. Vai-se pela Ruta 3, a 250 pesos de pedágio.

Outro lugar recente e demandado, a Leste, é Samaná, cercado por mar e lagoa, dividido com Las Terrenas. Resorts novos, hotéis, pousadas e a utilidade de apoio e turismo do comércio e serviços da cidadezinha, simpáticos e descompromissados como o são os das cidades praianas do Continente Sul. Poucos hóspedes brasileiros, outros de língua espanhola, canadenses, italianos, franceses, alemães. Pela Ruta 7 e depois a Estrada da Odebrecht… Punta e Samaná ficam a duas horas por rodovia.

Por lá

Sedãs, SAVs e SUVs são mandatórios aos turistas demandando por Samaná e Las Terrenas. Hóspedes em Punta Cana utilizarão o aeroporto da cidade, ou transfer de agências de turismo a partir de Santo Domingo.

O país possui cinco aeroportos e exceto Punta será mandatório alugar carro, havendo como opcional ônibus de operadores de turismo e os Guagua, como se chamam os micro ônibus tropicalmente desorganizados, com lotação superior à capacidade técnica, folclóricos e desaconselháveis.

Folheto de turismo distribuído nos hotéis enfatiza as belezas naturais, as praias, estradas, florestas, grutas e faz curioso alerta quanto ao comportamento social: o rápido é para amanhã.É uma das cláusulas pétreas da operação dominicana: não há pressa – ou noção de produtividade. Assim, quando você, por internet, faz e paga a reserva de um eventual SUV para sete lugares em locadora internacional, chega ao balcão, exibe o comprovante, nada garante a disponibilidade de tal veículo, e o fato será problema exclusivamente seu. O atendente da locadora informa ter havido erro no sistema; não haver o carro reservado; e que se quiser, procure em outra – onde haverá, mas a preço duplicado. E cobram, por cinco dias, US$ 1,200 por um SUV com mais de 100 mil km rodados – e dê-se por satisfeito, incluindo a demora. Não adianta ficar valente. Restará como opção os carros de turismo –US$ 200/pessoa/aeroporto-hotel !

Na República Dominicana não procure por identidade física nacional. Eles se orgulham ser produto de mescla entre índios, europeus e negros, e isto se espelha nas lembranças turísticas: bonequinhas não tem rosto.

Cuidado

Conduzir na capital, cidades periféricas, estradas, exige condicionamento de extrema atenção, exercício de tensão. Tudo, mesmo o inacreditável, pode acontecer: parar na alça de acesso para alguém descer; idem na via de velocidade deixando a Capital, o Guagua para junto à defensa para passageiro usar o micro ônibus como degrau para saltar sobre a barreira e cruzar correndo a pista de velocidade; picapes com mais de dezena de pessoas em pé na caçamba, são usuais e você reza para que nenhum caia no asfalto à sua frente. Parar com meio carro na estrada; retornar entre as fila do pedágio e sair na contra mão do acostamento; ultrapassagem sem visibilidade, sobre faixa dupla; sobre pontes. O inimaginável no trânsito acontecerá.

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Passageiros em caçamba de picapes (foto El Nacional)

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Fila do pedágio, saída da Capital


Termômetro

Por hábito me valho de embaixada brasileira para entender os lugares e ter referência em caso de necessidade. Um dos nossos diplomatas recomendou: aconteça o que acontecer, não proteste, não buzine, não reclame. As pessoas andam armadas e podem se sentir ofendidas com alguém querendo organizar a desordem. Fique quieto e espere a confusão se diluir.

Convívio com armas, coisa a nós inusual, faz parte do dia-a-dia. Nos postos de pedágio o segurança é do Exército e usa uma arma longa, fuzil ou escopeta. Nas estradas o policiamento é intenso: picapes com a sigla do Ministério de Obras Públicas e Comunicações, guardas com coletes refletivos, e armas longas na mão. Fiscalizam, ou fazem presença. Anda-se na velocidade definida: 80 km/h. Abordado ouvi conversa mole de a polícia estar ali para garantir a segurança dos viajantes, que o pagamento estava atrasado e por isto pedia uma colaboração. Respondi em alguma coisa parecida com francês e, ante a falta de compreensão, mandou seguir.

Na entrada do estacionamento de supermercado, o guarda usa arma longa. Em compensação, se você estiver armado, não será permitido, como informa o cartaz.

 

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No super mercado cliente não pode entrar armado …

 

Vais estacionar na rua da ultra movimentada Santo Domingo? – um terço da população ali habita. O flanelinha tem espaço definido por cones próprios. Ele o remove para você estacionar… No desencontro de preços, quatro horas de estacionamento custaram preço menor ao de uma garrafa de água italiana. Quase tudo é importado.

O país é bonito e variado, das grandes superfícies planas, às montanhas. O mar é matizado, azul caribenho na faixa banhada pelo Pacífico, na direção de Punta Cana, e verde com faixas azuladas na região banhada pelo Atlântico, onde está Samaná, servida por estradas particularmente boas ligam-na a Samaná. Bem sinalizadas, limpas, árvores plantadas nas laterais, capim cortado, placas visíveis. A via cruzando o Parque Nacional dos Haitis, mescla plano e serra, com paisagens como festa para os olhos, foi construída recentemente pela ora midiática Odebrecht. Dizem os locais, o pedágio também é da companhia. É dos mais caros do mundo para trecho sem telefonia de apoio ou serviço de socorro: 520 pesos – US$ 11, R$ 40 – para andar uns 17 km. Tenha-o em pesos. Se for pagar em dólares a cotação variará de acordo com o cálculo do caixa, uns 35 pesos x dólar. No comércio praticava-se 46×1.

Como no Brasil a Odebrecht responde a processo por corrupção para a conquista de obras públicas.

 

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Estradas turísticas são novas, limpas, sinalizadas

 

Seleção

Poucos dados a respeito da frota circulante, exceto o índice de motorização 3 habitantes/veículo, envolvendo o universo das motos. Como em todo país abaixo dos EUA seria razoável ver unidades dos velhos e resistentes carros de tal origem. Não os vi, exceto caminhões de marcas pouco lembradas no Brasil, como International e Mack, muitos de frotas novas ou surradas unidades trabalhando sem condições de segurança. Também velhos, remendados, japoneses dos anos ’90. E motos de pequena cilindrada, maioria chinesa, muitíssimas. É a condução do pais.

Veículos de produção brasileira, usuais em mercados de baixa cultura automobilística por resistência e preço, vi apenas duas exceções: velho Fiat Marea e Ford EcoSport da primeira geração. Automóveis caros, poucos: Mercedes 500, Audis RS8 e Q7, um Ferrari entrado em anos.

As estradas exibem a nítida separação de classes, privilegiando os estrangeiros.

Explicou o mesmo diplomata, quando o país optou pela economia baseada no turismo, elevou ou liberou o preço dos pedágios. Assim, os US$ 21 gastos entre Santo Domingo e Samaná, quase 1.000 pesos locais, excluem os dominicanos. Na estrada veem-se veículos novos com turistas, seus ônibus, as vans coreanas convertidas em micro ônibus Guagua, e motocicletas de baixa cilindrada, muitas e em estado a ser imaginado como padrão dominicano: pelo menos duas pessoas, sem capacete, falta de luz traseira, ausência de retrovisores. Motos não pagam pedágio.

 

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Moto pequena, sem retrovisores, capacete ignorado, padrão

 

País convive com o maior índice de acidentes das Américas, empatado com a Venezuela, mais de 40 mortes/ano/100 mil habitantes. Brasil, lamentavelmente líder na América do Sul, o índice é de 21,5% – e questiona-se a exatidão das estatísticas. Entendimento da Organização Mundial da Saúde mostra a renda da população ligada diretamente à acidentalidade. Menos renda, educação deficiente. A pouca vivencia com os veículos deve ser considerada. Convívio com automóveis não se aprende em apenas uma geração.

Vale a pena ir à República Dominicana? Vale. O leque de atrações, seja para o esportista – mergulho, snorkel, nado, surf, golf -, seja para os contemplativos, para os aventureiros em busca de lugares interessantes e de acesso difícil, ou a pasteurização norte-americana dos hotéis all inclusive. Tudo há e a preços inferiores aos praticados no Brasil. População amena, de trato sul americano. Recomendações usuais. Se insistir ficar em Santo Domingo, prepare-se como se fora passar uma semana na Baixada Fluminense, onde bobo vira estatística. Tenha um bom veículo, um bom hotel, escolha bem o lugar e despreze acampar. Tenha cuidado, paciência, seja zen, entre no clima quando a sobremesa anteceder a salada.